Este trabalho tem como objetivo apresentar ao público de língua
portuguesa, Rennyo Shonin (1415-1499), uma das mais notáveis figuras
na História do Budismo nipônico. A bibliografia sobre Cultura
Japonesa disponível em nosso idioma é ainda escassa e Rennyo Shonin
permanece quase desconhecido aos leitores do idioma de Camões. Possa
esta breve apresentação servir de intróito à vida e obra de Rennyo
Shonin, ajudando a compreender seu legado e importância para o mundo
contemporâneo.
O ser humano nunca é um fenômeno extemporâneo, desvinculado de seu
tempo e contexto. Nem por isso será pelo meio ambiente apenas
explicado. Homem e mundo interdependem. Somos seres situados,
interagindo com o contexto em que surgimos e no qual se desdobra
nossa existência. De nossas circunstâncias recebemos influência
tanto quanto também as transformamos. Isto sempre sucede mesmo
quando somos personagens obscuros e anônimos, o que não foi o caso
de Rennyo Shonin. Quinhentos anos depois dele, uma obra é editada
reunindo artigos redigidos em idiomas de povos que vivem em
distintos continentes, discutindo a importância de sua influência.
Em algum momento de sua vida teria ele imaginado tais conseqüências
para sua luta? Nem sequer eram conhecidos no Japão de seu tempo,
alguns dos locais e povos que hoje o reverenciam.
Rennyo Shonin teve um papel decisivo para o futuro da tradição
Budista fundada por Shinran Shonin (1171-1262), a Escola da Terra
Pura, Jodo Shinshu, que reúne hoje o maior número de adeptos no
Japão. Esta denominação abrange duas vertentes principais,
Honganji-Ha e Ohtani-ha, popularmente conhecidas como Nishi e
Higashi Honganji. Juntas reúnem não só o maioria da população
Budista nipônica, como também o maior número de Templos e monges
dentre todas as escolas Japonesas. Estas gigantescas instituições
nasceram do espírito de devoção e empreendimento de Rennyo Shonin,
numa compreensão original da relação entre o sagrado e o profano.
Como veremos em mais detalhe adiante, a obra de Rennyo consolida a
manifestação do sagrado no tempo e expande seu alcance no espaço
através de um veículo, um “corpo” institucional. Numa analogia
livre, o Honganji seria qual o “Nirmanakaya” da doutrina da
libertação através do Nembutsu do Outro Poder.
Mas a importância da obra de Rennyo não se restringe ao contexto do
Budismo nipônico. A pertinência e eficiência de sua visão da relação
entre sagrado e profano o insere num âmbito de questões que
pertencem a história das religiões. Sua proposta ultrapassa as
vicissitudes da cultura e sociedade Japonesa e discute um problema
que diz respeito a toda e qualquer tradição religiosa. O desafio de
criar condições para a continuidade e atualização de uma mensagem
espiritual no curso da história não se coloca apenas ao Budismo nem
somente no Japão. É na verdade questão que se põe à todas as
religiões. E não se põe apenas uma vez mas retorna como desafio
constante, a cada e todo momento no curso do tempo. Neste desafio,
se revelam sempre em risco tanto a instituição como a mensagem que
ela veicula.
Na seção de Egito do Metropolitan Museum, em New York, há uma
pequena estatueta que só a legenda elucida ao visitante: “Bes,
Divindade cultuada no Egito Antigo”. Ruiu um dia a instituição que
congregava aqueles que cultuavam esta Divindade, ruiu também a
sociedade em que esta tradição se inseria. Desapareceu para sempre a
mensagem que um dia deve ter animado um fervor análogo ao que hoje
inspira a chama que para nós ainda brilha. O “Nirmanakaya”
institucional possibilita que o “Dharmakaya” da mensagem perdure e
amplie seu alcance no mundo das formas e dos nomes.
Antes de Rennyo, o que conhecemos como Jodo Shinshu era uma doutrina
e vivência sem instituição expressiva que as sustentasse. Como não
se pode conhecer alternativa para a História já sucedida, é
impossível saber se e como esta mensagem poderia sobreviver caso não
tivesse ocorrido a consolidação, realizada por Rennyo, de um veículo
institucional como o Honganji. O que o sucedido nos assegura é que
no caso de Jodo Shinshu, a sobrevivência e expansão da mensagem, até
mesmo para além do Japão, se deu de fato através das atividades
desta instituição. O presente ensaio discute o significado da
contribuição de Rennyo Shonin no contexto da relação entre a
ampliação de alcance, no espaço e no tempo, da mensagem da Escola da
Terra Pura (Jodo Shinshu) e o suporte o veículo institucional a cuja
consolidação ele dedicou toda sua existência.
Este artigo está sendo redigido no Brasil, por autor nascido na
cidade do Rio de Janeiro, descendente de imigrantes portugueses há
várias gerações aqui radicados. Seu primeiro contato com Jodo
Shinshu foi através de um livro. O trecho de maior impacto na obra,
era a narrativa de episódios ocorridos no Japão, séculos atrás, com
pessoas iletradas que expressaram de maneira ímpar a experiência e
vivência Budista. Myokonin, (pessoa rara e maravilhosa) fora o termo
cunhado no passado para designá-las, à medida em que o fenômeno
proliferava e atraia a atenção de seus contemporâneos. Com base em
depoimentos transmitidos oralmente, episódios de suas vidas foram
sendo compilados e posteriormente editados.
O que chegou às mãos do jovem brasileiro eram fragmentos de um
cotidiano simples, vivido há muito, em vilas interioranas de um
arquipélago antípoda. A persistência destas memórias no tempo e sua
propagação no espaço não pareciam fatos irrelevantes. Ao contrário,
intrigavam cada vez mais, quanto mais contrastavam com tudo o mais
que se perdeu, desde aquela data remota até os nossos dias, de um
dia a dia humilde vivido nas aldeias simples daquele país distante.
Nas muitas madrugadas de leitura prolongada, entre tantas emoções
vividas nas descobertas que se abriam, aquele jovem brasileiro
agradecia a oportunidade inestimável de conhecer pessoas
raras e maravilhosas que se incorporavam à sua vida como amigos
e estrelas guias. Pessoas que viveram tão longe no espaço e no
tempo, tornaram-se íntimos companheiros.
Vezes e mais vezes o surpreendia a constatação da existência de uma
misteriosa ponte que ligou uma vila no interior do Japão medieval a
um adolescente na cidade do Rio de Janeiro na segunda metade do
século XX. Por esta ponte passaram as memórias que viriam a integrar
e transformar decisivamente toda uma vida. Como teria sido
construída esta ponte? E por quem? A maioria dos indivíduos que
participaram desta construção permanece anônima. Foram todos aqueles
de quem os textos não falaram mas que estiveram lá como
participantes ativos no caminho de u’a mensagem libertadora que se
ia propagando. Imorredoura porém, ficou a figura que os reuniu e
organizou, que catalizou em torno de si todos os que desconhecemos,
desencadeando a história da instituição que hoje nos abriga.
Ao início eram amigos que se reuniam para compartilhar a Fé que lhes
fora transmitida. Os encontros ocorriam em suas casas. Só mais tarde
viriam os pioneiros, construindo os primeiros Templos. O número de
amigos era grande, somavam já vários grupos. As opiniões eram
numerosas, variadas e em muitos casos díspares. Tentando conservar
viva e íntegra a mensagem da libertação através do Nembutsu do Outro
Poder e desejando transmiti-la a outras pessoas, eles tinham de se
organizar. Começava a se desenvolver uma instituição, o Honganji.
Não podemos também esquecer o caráter conturbado e com freqüência
ameaçador do contexto em que tudo isto sucedeu . Estamos falando de
um dos períodos mais sangrentos da história do Japão. Desde a morte
de Shinran em 1262 até a morte de Rennyo 1499, a luta pelo poder
incendiava o mundo nipônico em guerras constantes. As instituições
Budistas foram várias vezes atacadas, Templos foram incendiados,
monges eram assassinados. Veremos adiante como estes conflitos
ameaçaram e perseguiram Rennyo durante quase toda sua vida.
Apesar de todas as adversidades, ia se consolidando a organização
dos adeptos e seus Templos. Na vizinhança deles, vez ou outra
borbulhava, num episódio do cotidiano, uma expressão eloqüente da
experiência Budista em personagens humildes, iletrados. A memória
destes episódios ia sendo recolhida por contemporâneos,
sensibilizados pela expressão de compaixão e sabedoria que emanava
daquelas pessoas simples. Nestes Templos vinham orar muitos
Myokonins. Entre os adeptos, alguns narraram histórias do que
ouviram ou presenciaram dos episódios de vida daqueles homens
humildes e sábios. A comunidade vinculada a esta instituição, foi
preservando as memórias destes seres anônimos em seu tempo. Até que
um dia, para que não fossem esquecidas, alguém as redigiu. Mais
tarde outrem as editou e por fim alguém as traduziu. Estes livros
levariam mensagens de vida mais longe que a voz. Inclusive até ao
Brasil.
O estudo de episódios de vida dos Myokonins levou aquele estudante
brasileiro, no começo da década de setenta, a buscar o arcabouço
doutrinário em que estavam inseridas aquelas vivências e ao qual
davam expressão. Uma experiência espiritualmente complexa e rica
como a dos Myokonins nascia no contexto de um corpo de idéias que o
jovem brasileiro sabia ignorar. O diálogo com estas pessoas simples
ia incitando indagações. O que é o Budismo da Terra Pura, território
em que se enraíza a experiência destas pessoas
raras e maravilhosas?
Outra vez o caminho das respostas encontrava-se em livros, únicos
companheiros no Dharma para alguém que descobria o Budismo da Terra
Pura na cidade do Rio de Janeiro naquela época. À medida em que esta
bibliografia ia sendo percorrida, esclarecimentos surgiriam. Desde
as obras fundamentais até os muitos textos de comentários, a
doutrina em que se situavam os Myokonins ia sendo descortinada. A
proposta revolucionária de Jodo Shinshu, exposta por Shinran Shonin,
sobrevivera mais de setecentos anos. Nas obras em que o legado
estava preservado, o jovem brasileiro entrevia bem mais que as
palavras de Shinran. Sòzinhas, elas não podiam explicar a sua
própria sobrevivência. O fato de sua sobrevivência e a travessia do
mundo até chegar ao Rio de Janeiro implicava em que muito mais
sucedera, além do que os textos de Shinran diziam e sua biografia
narrava.
Desde aqueles que ouviram as palavras ditas por Shinran e
presenciaram suas atitudes e iniciativas, gerações sucessivas
discutiram o significado e as implicações de suas idéias e sua vida.
O fórum onde convergiam estes debates eram os Templos onde adeptos
se reuniam e onde monges pregavam. Fatos da biografia desses
adeptos, interpretações e novas concepções foram se somando à
memória da vida e obra de Shinran, na construção de uma herança de
vivências e idéias que exprimem uma peculiar compreensão da
existência e do ser humano.
Após a morte de Shinran, nem a doutrina da Terra Pura nem a sua
contraparte de vivência permaneceram estáticas. Para uma tradição
herdeira da noção de Annica (Impermanência) como modo próprio de ser
do real, a recriação contínua era a tendência mais natural. No curso
da História, ao mesmo tempo em que a doutrina formulada por Shinran
passava por interpretações e ampliações, também permanecia exposta
ao risco de desvios e distorções. Fruto de uma enorme diversidade de
opiniões, foi-se construindo um consenso sobre o sentido da proposta
de Shinran Shonin e o caminho da Terra Pura. Agregando todos estes
elementos, a vida da instituição acabou por formar uma tradição.
A experiência espiritual de Shinran e o conteúdo de suas obras
desencadearam um processo complexo e poderoso. A comunidade que se
formou, unida pela experiência que ele exemplificara e pelas idéias
que transmitira, acabará por se transformar numa Escola. E é
justamente neste processo de institucionalização que surgirá como
figura fundamental o Oitavo Patriarca, Rennyo Shonin. Seu papel,
como veremos, foi decisivo seja na formulação de uma unidade
doutrinária, seja desenvolvendo instrumentos de divulgação, regras
de organização, rituais, enfim transformando um incipiente
agrupamento de pessoas numa sólida e bem estruturada instituição.
Estes fatores contribuíram de maneira decisiva para que as palavras
de Shinran chegassem até o adolescente brasileiro.
A experiência que aquele jovem no Brasil espreitava através dos
episódios relatados e a doutrina que ele estudava, haviam percorrido
toda uma longa trajetória na qual o suporte material de sua
sobrevivência foi sempre uma instituição, o Honganji. A mesma ponte
que ligara as vivências de pessoas simples em vilas no interior do
Japão a tantos lugares distantes no mundo, transmitia também as
idéias de alguns dos mais importantes pensadores nipônicos. Uma
ponte sustenta quem por ela passa. Este foi o papel da
institucionalização: possibilitou que o espiritual se desdobrasse no
tempo, perdurando, e ampliasse seu alcance no espaço. Quando se
procura entender como se deu a consolidação deste “veículo
institucional”, diante do papel decisivo de Rennyo neste processo,
fica então clara a razão pela qual tantos autores o consideram o
“segundo fundador” da Escola da Terra Pura.
Tradicionalmente, Shinran Shonin é reverenciado como fundador de
Jodo Shinshu. O título de Shonin foi-lhe atribuído muito depois de
sua morte quando o movimento organizado por seus sucessores ganhou
vulto. O próprio Shinran não deixou indícios de que pretendesse
estabelecer uma nova instituição religiosa. Durante toda a sua
vida, não fundou Templos, não criou ritos, nem estabeleceu qualquer
hierarquia eclesiástica. Shinran foi um pensador com uma visão
doutrinária do Budismo de indubitável originalidade e profundidade.
Seu carisma pessoal e drama biográfico tiveram impacto na sociedade
da época, o que pode ser medido pelos numerosos grupos de seguidores
que se formaram em diferentes localidades do país, ainda durante sua
vida. Com sua obra escrita, Shinran abriu uma nova compreensão do
Budismo. Com sua vida legou um exemplo de espiritualidade. Ele só
não fundou uma instituição religiosa.
Isto seria esboçado por seus descendentes estabelecendo uma linhagem
patriarcal e pelos adeptos construindo Templos, criando regras de
organização, constituindo a instituição que veio a ser conhecida
como Honganji. Este processo, que principia após a morte de Shinran,
quase dois séculos depois ainda claudicava. Tal como outras
instituições renovadoras que floresciam na época, assim como tantas
anteriores e posteriores, o Honganji nos meados do século XV
permanecia a um passo do desaparecimento. Apesar de abrigar a
linhagem de descendência de Shinran, permanecia pouco expressiva
mesmo entre os grupos que se pretendiam representantes do movimento
da Terra Pura. Descrições da época retratam um pequeno Templo de
poucos adeptos, contrastando com a pujança de outros Templos que
também pregavam o caminho do Nembutsu e mais ainda quando se
considera o poder e influência que tinham as grandes instituições
tradicionais da época como a Escola Tendai ou a Escola Shingon,
entre outras.
Será este frágil e inexpressivo Templo, Ohtani Honganji, no distrito
de Higashiyama em Kyoto, que em 1415 acolherá um menino chamado
Hoteimaru. Ele era descendente direto de Shinran na oitava geração.
Nós hoje o conhecemos por um nome posteriormente adotado, Rennyo.
Zonnyo, era o nome de seu pai. Em 1440 quando o avô de Rennyo
falece, Zonnyo, assume o cargo de guardião do Salão do Fundador e
se torna o líder do Honganji. A penúria da família sugere a
incipiente expressão que esta precária instituição possuía na época.
Minor e Ann Rogers ( “Rennyo”, Asian Humanities Press, Berkeley,
1991, pag. 49) recorrem ao Jitsugo kyuki na descrição das
dificuldades por que passava Rennyo tanto durante sua juventude como
já na maturidade: “Por não poder
dispor de uma lamparina de óleo, Rennyo lia os textos tradicionais a
luz de uma lareira cuidadosamente racionada ou muitas vezes a luz da
lua…algumas vezes passava dois ou três dias sem refeições.” Segundo
os Rogers, no período anterior a Rennyo “…não
há evidência de que o Honganji tenha experimentado qualquer fase de
crescimento significativo em comparação com outros ramos de
Shinshu.” Ainda na mesma página, citando o Jitsugo kyuki, os
Rogers dizem: “Referência
específica menciona a ausência de visitantes e a solidão em que se
encontrava o recinto do Templo antes do nascimento de Rennyo, em
contraste com as “nuvens” de peregrinos que acorriam ao Bukkoji
situado nas vizinhanças.” Estes dados indicam a precariedade
da instituição que Rennyo encontrou. Ohtani Honganji era apenas um
pequeno Templo desolado à sombra dos gigantes circundantes como
Shoren-in e Chion-in.
Este é o contexto em que se insere o pedido que Rennyo, ainda
adolescente, ouvirá de sua mãe: que ele recuperasse a mensagem de
Shinran e a divulgasse por todo o Japão. E isto, nós veremos, ele de
fato realizou. E como?
A obstinação inabalável de Rennyo na tarefa de expandir e fortalecer
o Honganji parece indicar que para ele a consolidação institucional
era o caminho para salvar a mensagem de Shinran e ampliar seu
alcance. Dois fatos em sua biografia servem como símbolo desta
visão.
Sua luta, durante anos, procurando salvar a imagem do fundador nas
muitas fugas durante os ataques que o Honganji sofreu, para ao final
da vida entronizá-la no Templo em Yamashina. A imagem representava
a mensagem e o exemplo de vida de Shinran Shonin. O Templo que um
dia a abrigaria em segurança, era expressão da solidez que a
instituição deveria ter, para que não se perdessem, mensagem e
exemplo.
Outro fato significativo é a ênfase que durante toda a sua vida ele
dará às obras que mais marcaram suas leituras de juventude,
Kyogyoshinsho, o Rokuyosho e o Anjin ketsujosho. Segundo Renjun (M.
e A. Rogers, obra citada, pag. 52) na releitura desta última,
Rennyo consumiu três exemplares. (Dizia-se que Confúcio três vezes
trocara a capa de couro de seu exemplar do I Ching, obra a cuja
leitura se dedicou ao longo da maior parte de sua existência.) O
oitavo Patriarca nunca perdeu de vista a importância vital da
doutrina e legou sua contribuição à compreensão da mesma nas Cartas.
O Templo que abrigaria a imagem do fundador, seria também o guardião
da doutrina. Assim, para Rennyo, uma instituição sólida e poderosa
asseguraria a sobrevivência e expansão da mensagem de que era
herdeiro, o legado do Nembutsu do Outro Poder.
Esta tarefa era ainda mais crucial naquela segunda metade do século
XV dada a convulsão social em que estava mergulhado o Japão. Quando,
no século XII, com a ruína econômica do Império o governo passa às
mãos dos Samurai, o poder detido pelo primeiro mandatário torna-se
disponível à disputa. Antes ele era transmitido hereditariamente e
por isso permanecia inquestionável. Quando alguém que não era
descendente de Amaterasu torna-se governante, abre-se a todos a
questão: “Por que ele e não eu?” A espada empunharia a indagação e
só ela daria a resposta. Até a ascensão dos Tokugawa (1615) a paz
sobrevive apenas por breves hiatos para em seguida desaparecer ante
a eclosão de um novo conflito. Mas a violência não apenas rondava os
Templos Budistas. Já desde a época dos primeiros Sohei, as milícias
de monges guerreiros, que alguns Templos da escola Tendai recorriam
às armas. Ao início para se defender, depois para impor uma ordem,
uma vontade ou por fim seus próprios interesses.
Aqueles eram tempos terríveis, em que morrer vitimado pela violência
era um fato corriqueiro. E se isto valia para qualquer indivíduo,
não muito diferente era a condição de uma pequena e precária
instituição como o Honganji. Com a morte de Zonnyo em 1457, Rennyo
assume como sucessor. Oito anos depois, em 1465, quando seus
esforços missionários começam a frutificar, ocorrerá o primeiro
ataque das milícias do Enryakuji destruindo parte do Ohtani
Honganji. Ainda no mesmo ano haverá um segundo ataque, que arrasará
todo o Templo. Em seguida haverá o ataque aos seguidores do Honganji
em Akanoi, Omi. A imagem do fundador será transferida para Annyo-ji,
depois para o Honpukuji, em seguida para Otsu até finalmente ser
entronizada em 1480 no Salão do Fundador construído em Yamashina.
Estes poucos dados já evidenciam o grau de riscos a que estava
exposto o Honganji na época. Só uma liderança de rara habilidade e
cautela possibilitaria a sobrevivência e a expansão do Honganji num
período de tão forte turbulência. Aqueles críticos que pretendem
reduzir Rennyo a uma figura de importância mais política que
espiritual parecem esquecer que o espiritual que enaltecem talvez
tivesse perecido não fora a habilidade por eles menosprezada. Por
outro lado, a crítica se funda numa dissociação entre o espiritual e
o temporal da qual Rennyo escapou. E por fim, quando se estuda a
contribuição doutrinária de Rennyo através de seus escritos, fica
evidente que a crítica está longe de lhe fazer justiça.
A principal fonte para um estudo sobre Rennyo são as suas “Cartas”
( Gobunsho). Sua leitura ritualística é parte integrante do
cotidiano nos Templos, além de fonte de estudo e referência para os
adeptos da Escola da Terra Pura. Foram compiladas pelo neto de
Rennyo, Ennyo (1491-1521). Nelas se pode ver tanto a complexidade da
obra a que Rennyo se devotou, como a personalidade inusitada que a
possibilitaria. Nestas cartas, o sagrado e o profano dialogam sem
cessar. Um tecido vai montando sua trama com fios variados. Questões
organizacionais, dúvidas doutrinárias, problemas pessoais, dos
adeptos ou do próprio autor, as pressões políticas do momento, etc.,
em todos os assuntos Rennyo vai aclarando a compreensão da mensagem
da Terra Pura ao mesmo tempo em que extrai, da mesma seqüência de
raciocínio, a necessidade e importância do fortalecimento da
instituição, guardiã do legado.
Tomemos um exemplo dentre tantos disponíveis. Um mal-estar físico do
próprio autor, num cansaço que se prolongava: I-6
Como dissemos, o tema inicial escolhido por Rennyo é um mal-estar
físico, o cansaço que o vem acometendo, neste verão de 1473.
Qualquer leitor de então ou de agora, poderá sem dúvida
identificar-se no que o autor descreve. A todos nós também isto nos
sucede vez ou outra.
Porém, ao invés de recorrer apenas a um remédio, Rennyo aproveita
esta circunstância para relembrar a doutrina. A morte nunca se sabe
quando virá, mas sem dúvida pode ser agora. Mas ao mencioná-la,
Rennyo de imediato acrescenta “que nos conduz ao nascimento (na
Terra Pura)”. O nascimento na Terra Pura só é possível na morte pois
aqui estamos presos a limitações e paixões, não nos podemos tornar
Budas, permanecemos inexoravelmente humanos e imperfeitos. Se assim
é, então ante a possível iminência da morte deveríamos estar
tranqüilos e confiantes.
Mas Rennyo afirma que se entristece e sofre em especial a dor de
partir. Ressalta ainda que no entanto, até aquele momento ele sempre
se preparou, sem descuidos, pensando que o instante do nascimento
pode ser iminente. Ou seja, de nós nunca se aparta o apego. Qual a
sombra que acompanha o corpo iluminado, também esta fundamental
ilusão e erro permanece conosco, ainda que nos esforcemos. É então
em vão nossa luta? Não. Logo em seguida Rennyo irá admoestar seus
companheiros por se descuidarem do esforço a que ele se dedicava.
Relembremos o mito grego em que os Deuses condenam Sísifo a rolar
uma pedra para o alto de uma montanha. A pedra sempre outra vez
cairia, o homem sempre outra vez haveria de recomeçar sua labuta sem
fim.
Não se pode ser humano sem lutar, mas não é aqui que se vence. Aqui
apenas se pode lutar. A acomodação ao apego arrasta-nos a um
sofrimento ainda maior. Lutando contra esta acomodação, nem por isto
seremos só e sempre felizes. O fato de nos entristecermos pelo apego
que persiste, também não nos impede de sermos felizes. É só para
Aristóteles e seus seguidores que “uma coisa não pode ser e não-ser
ao mesmo tempo e do mesmo modo”. O Budismo, já desde de Nagarjuna
que formulou uma lógica das contradições. Graças a ela, o Myokonin
Asahara Saiichi (1850-1932) pode dizer: “O miserável coração da tristeza…
Em seguida Rennyo então dirá que “ Tudo o que mais desejo, dia e
noite, em relação a isto, é que após a minha morte não haja
retrocesso naqueles dentre os visitantes deste Templo cuja Mente
Confiante esteja decisivamente consolidada.” Sua maior preocupação
começa se revelar. É com aqueles que visitarão o Templo depois que
ele se for. Que não sofram nenhum retrocesso espiritual. Para isto é
necessário que a Mente Confiante esteja irreversivelmente
consolidada. Ele olha em torno de si e vê que isto não está
sucedendo. “Mas cada um de vocês se tem descuidado na reflexão sobre
o nascimento. Enquanto vocês viverem, devem procurar ser tal como
lhes descrevi. Sinto-me insatisfeito com o que cada um de vocês
compreendeu.” A angustia de Rennyo é por cada um, como indivíduo. É
a percepção do Boddhisattva de que o outro é alguém como nós. Sua
errância é nosso vagar. Sua dor é também um nosso sofrer. Mas este
outro não é apenas aquele que ali estava e a quem Rennyo conhecia.
Eram tantos que viriam depois. Eram aqueles que viveriam no futuro e
viriam ao Templo, lugar em que se compartilha a dádiva e a gratidão.
Caso não esteja irreversivelmente consolidada neles a Mente
Confiante, o Templo ruirá e a mensagem poderá se perder. Um Templo
depende da mente de seus adeptos. A instituição vive da chama de
devoção dos adeptos. Sem isso, ela morre. E sem a instituição como
poderão saber, os que virão depois, o que um dia se revelou? De um
seu mal-estar, da sonolência excessiva, Rennyo nos vai conduzindo a
um mergulho no Dharma, a um encontro com a Sangha no compromisso com
uma instituição que possa ser abrigo aos que viverão depois,
permanecendo guardiã da mensagem que o Buda da Luz e Vida Infinitas
destinou a todos os seres. Também para o mal-estar passageiro, ao
final o tríplice refúgio, o Buda, o Dharma e a Sangha.
Ao mesmo tempo em que luta por consolidar a identidade e estrutura
institucional da Escola da Terra Pura, Rennyo evita o sectarismo e
apresenta uma visão abrangente das várias correntes Budistas: III-2
O respeito e reconhecimento que Rennyo demonstra para com as demais
Escolas Budistas ganha ainda maior relevância quando atentamos ao
fato de que este trecho data de 1474. Desde 1465, quando atacaram e
destruíram Ohtani Honganji, que Rennyo e a Escola da Terra Pura
vinham sofrendo perseguições violentas por parte principalmente das
milícias do Enryakuji, Templo da Escola Tendai.
Numa de suas últimas cartas, IV-15, Rennyo reflete sobre a
construção de um Templo em Osaka: “Após ver Osaka pela primeira vez,
construí logo um Templo simples, em estilo tradicional, em
virtude, com certeza, de alguma ligação com aquele lugar no
passado. A construção começou ao final do outono no quinto ano
de Meio. Três anos já se passaram. Sinto que tudo isto resulta
de condições profundas emanadas do passado.
Ao final de sua vida, referindo-se a um pequenino Templo simples que
há pouco construíra, Rennyo nos responde também porque construíra
todos os demais Templos, porque dedicara sua vida a transformar
grupos dispersos de pessoas que recitavam o Nembutsu, numa sólida
unidade organizacional. O espírito empreendedor estava, como tudo
nele, a serviço da realização espiritual de todos os seres.
Logo ao início Rennyo sugere que Templos não nascem da mera vontade
dos homens. Estão em jogo ligações que vêm de um passado remoto e
permanecem sempre na penumbra de um insondável mistério. Os Templos
surgem em lugares nos quais ressoa uma correspondência antiga. E
talvez se construam a si mesmos através de nós. Existem para que os
adeptos tenham um abrigo que os acolha cada vez que se encontrarem
para discutir o Dharma e exprimir sua gratidão ao Buda Amida.
Deste evento, descrito no primeiro parágrafo do texto, ele amplia o
horizonte de sua reflexão para explicar-nos como via o sentido de
sua existência neste mundo. Ele era alguém que não viera ao mundo
para usufruir nem da tranqüilidade, nem do conforto ou da beleza.
Sua palavras nos recordam a passagem em que o grande poeta português
Fernando Pessoa diz: “Não conto gozar a minha vida
Em Rennyo, assim como para Pessoa, era preciso dedicar sua vida a
todos os seres. “Meu único anseio é que os
praticantes em quem a Mente Confiante esteja decisivamente
consolidada floresçam e que os companheiros praticantes que
recitam o Nembutsu venham em busca da Suprema Iluminação.”
Se necessário fosse, ele abriria mão de seu apego ao lugar estimado,
nos diz em seguida, num sentido que parafraseia as duas últimas
estrofes da poesia lusitana citada. Seu anseio constante, vezes e
mais vezes repetido ao longo de várias outras cartas e reiterado
ainda ao final desta, é que todos “pudessem realizar o sentido
fundamental (do Dharma), o nascimento na terra da suprema alegria.”
Este é o centro para onde converge toda a sua existência. Tudo o que
ele buscou realizar, só por isto se explicava e justificava. Para
isto era preciso preservar a mensagem da Escola da Terra Pura, tal
como fora transmitida por Shinran Shonin. Para preservá-la era
preciso construir uma instituição-guardiã sólida e bem estruturada.
Ela não poderia sê-lo sem a força da vivência espiritual da Mente
Confiante consolidada em seus adeptos. Os Templos eram, para Rennyo,
um lugar onde as pessoas se reuniriam na busca de compartilhar suas
dúvidas e descobertas, para ouvindo o Dharma, deixarem a Mente
Confiante se estabelecer decisiva e irreversivelmente. Os ofícios
eram momentos de expressão da nossa gratidão ao Buda Amida, pela
vida e pela morte. Na carta IV-13 “Reflexões ao início do verão” ele
inclusive citara Honen que dissera: “Os praticantes que
aspiram a Terra Pura enchem-se de alegria quando adoecem” pois é
sinal de possibilidade mais próxima do nascimento na Terra Pura. Na
carta em que faz esta citação, no primeiro dia do meio do verão de
1498, Rennyo ainda lamenta que não sinta assim e considera
deplorável seu sofrimento com a doença. Logo a seguir, na carta
IV-15 a nuvem se dispersara e a luz de Amida brilha plena, quando
ele já pode dizer em plena serenidade: “Sinto, enfim com certeza, que não
falharei em alcançar meu tão longamente acalentado desejo de
nascer na Terra Pura durante o próximo inverno.”
Séculos depois de Rennyo, o escritor português Félix Bermudes, ao
seu referir a leucemia que o acometia, diz poucos dias antes de
morrer: “Estou vivendo uma
experiência maravilhosa, fruto das colheitas enceleiradas na minha
jornada de otimismo, respigando ensinamentos espirituais, através de
uma longa existência sem vazios, nem desfalecimentos, sem
descrenças.” Bermudes, Félix, “A conquista do eterno”, Ed. Civilização
Brasileira, 1974, pag. IX
A mensagem da Luz e Vida Infinitas transcende forma e nome. Por isso
não se circunscreve a fronteiras culturais. Ao contrário,
inscreve-se na natureza humana e se manifesta independente de
informações exteriores, conceitos codificados ou vínculo
institucional. O Sr. Félix Bermudes, até onde sabemos, não tivera
contato com a literatura da Escola da Terra Pura e, no entanto, seu
texto poderia ser assinado por algum Myokonin nipônico. A Mente
Confiante é de fato a Mente da verdade. E como tal, certamente se
manifesta fora do mundo Budista e de suas instituições. Mas quando o
faz, o faz sob outra forma e linguagem, usa um outro veículo. A
instituição preserva o veículo formal e conceitual. Rennyo sabia a
importância da contribuição que Shinran trouxera com o modo peculiar
e inovador com que reinterpretou o Budismo. Com ele se estabelecera
um novo veículo que conduziria muitos, inclusive Rennyo à realização
da Mente Confiante. O esforço de Rennyo para fortalecer o Honganji
como instituição, visava salvar o modo pelo qual esta manifestação
chegara a ele como a tantos outros. Assim como a correspondência com
os locais, a que se referira no caso do Templo em Osaka, assim
também há uma correspondência entre o praticante e uma forma que lhe
veicula o sem-forma. Recorrendo outra vez à analogia dos Kayas,
Rennyo queria salvar o “Nirmanakaya” que Shinran Shonin expressara e
que fora o veículo através do qual o “Dharmakaya” do Poder
libertador da Luz e Vida Infinitas se lhe revelara. Não nos é
possível chegar ao “Dharmakaya” do conteúdo da mensagem senão
através da mediação do “Nirmanakaya” de uma forma através da qual o
conteúdo é indicado. É através de palavras que podemos nos abrir ao
que transcende a palavra. Por isso, na Escola da Terra Pura se
ressalta a importância de “Ouvir o Dharma”. Era esta também a razão
pela qual Rennyo insistia em que os adeptos se reunissem para
discutir o Dharma. Carta I-12. “Os encontros são
ocasiões em que, mesmo sendo só uma vez ao mês, aqueles que praticam
o Nembutsu devem ao menos se reunir no local de encontro e discutir
sua (experiência) da Mente Confiante, bem como a dos outros. …
Concluindo, definitivamente é preciso que de hoje em diante se
discuta a Mente Confiante nas reuniões. Pois é assim que atingiremos
o nascimento na verdadeira e real terra da suprema bem-aventurança.”
Para Rennyo, o caminho espiritual não era solitário e sim solidário.
Já Shinran no capítulo VI do Tannisho definira a sua relação com os
adeptos como de amizade e companheirismo. Este sentido de
fraternidade e diálogo para compartilhar o caminho determina que, no
caso da Escola da Terra Pura, a institucionalização se tornasse uma
decorrência necessária. Em Shinshu, a vida espiritual é também
social. Com o rompimento da exigência do celibato para aqueles que
optavam pela vida monástica, Shinran insere o cotidiano religioso no
mundo leigo. Monges e monjas casam, têm filhos. Agora os monastérios
teriam de ser construídos nas cidades. O sagrado e o profano
coexistem no espaço, compartilham um mesmo mundo e uma semelhante
existência diária. A vida social supõe o estabelecimento de regras
de convívio e toda comunidade acaba por ter de organizar-se. A via
da Terra Pura difere fundamentalmente do caminho do asceta hindu,
meditando no silêncio recluso de uma caverna. Para ele talvez a
instituição seja apenas mais um véu de Maya. Mas ele é um só e seu
apenas é o caminho que trilha. Sua meta é libertar-se. A de Shinran
e Rennyo é que libertemo-nos todos e juntos.
O pedido de sua mãe, Rennyo sem dúvida realizou. É inegável que ele
conseguiu recuperar a mensagem de Shinran e a divulgou por todo o
Japão. A instituição que ele viu como meio de realizar a preservação
e expansão desta mensagem, sobrevive já quinhentos anos após sua
morte e ultrapassou o arquipélago do Sol Nascente, tendo levado o
chamado do Buda da Luz e Vida Infinitas para o continente Asiático,
as Américas, a Europa e alcançou já à última fronteira, a África. Há
que comemorar, hoje mais que ontem a obra de nosso oitavo Patriarca.
Sempre quando se comemora, somos chamados ao passado, para
reverenciá-lo e agradecer. Mas todo passado revisitado, indaga ao
presente pelo futuro. Os desafios que hoje enfrentamos são muito
diferentes daqueles que enfrentava em seu tempo o Oitavo Patriarca.
Mas lá, no Gobumsho, nas Cartas, e na vida de quem as escreveu, há
indicações que nos ajudam a encontrar soluções para as nossas atuais
dificuldades. Para que a mensagem que nos chegou sobreviva pelo
futuro e não termine como u’a imagem numa sala de museu com texto
indicativo de data e região ao lado, Rennyo nos pode ainda orientar.
O Honganji, nos cinco séculos que nos separam de Rennyo, tornou-se
uma instituição vasta e poderosa. Já não a ameaçam perigos externos
como acontecia naquele tempo. Mas os perigos internos continuam
muito semelhantes aos que o Oitavo Patriarca também enfrentou. Sua
palavras e advertências guardam por isso a mesma pertinência.
Lembremos sempre de sua atitude em relação ao Templo em Yoshizaki,
tal como nos relata na carta I-8: “(Nestes três anos) monges e leigos,
homens e mulheres têm vindo em grande número para cá. Mas como
isto parece não ter nenhum objetivo, eu este ano proibí seu ir e
vir. Para mim, a razão fundamental para se estar aqui é que,
tendo recebido a vida na condição humana e tendo já encontrado o
Budismo, o que é difícil, é de fato vergonhoso que se caia, em
vão, no inferno. Por isso eu concluí que pessoas que não estão
preocupadas com o estabelecimento decisivo da Mente Confiante do
Nembutsu e com o nascimento na terra da suprema Bem-aventurança
não deveriam se reunir neste lugar. Esta atitude se deve ao fato
de que para nós o fundamental não é renome ou ganho pessoal mas
apenas a iluminação na outra vida. (…)”
Relendo hoje este trecho do Gobunsho, devemos nos perguntar o que
sucederia se Rennyo visitasse cada um e todos os nossos Templos pelo
mundo afora. Poderíamos mesmo recebê-lo sem temor de sua avaliação?
Será que a nenhum de nossos Templos ele desejaria hoje fazer o mesmo
que fez em Yoshizaki? Será que nestas construções que atendem pelo
nome de Templo Honganji, nos reunimos, monges e leigos, homens e
mulheres, para buscar intensamente a consolidação irreversível da
Mente Confiante e o nascimento na Terra Pura? Falando apenas do que
observo no Templo da cidade em que moro, São Paulo, devo admitir que
com mais freqüência o que nos traz ao Templo, monges e leigos,
homens e mulheres, é a obrigação de um ofício memorial. Aos monges
pelo Ofuse ou por um “dever de ofício”, aos leigos por uma obrigação
social ou um vago medo supersticioso. Ouvindo atentamente tudo o que
se conversa entre monges ou leigos, homens e mulheres, nem sempre o
mais freqüente assunto é o Dharma. Nos ofícios memoriais, bem como
nos casamentos, ao fundo do salão do Hondo, os assuntos já nem se
prendem à memória do morto ou as núpcias que se celebram. Nestes
recantos, em voz baixa, não é tanto o Nembutsu o que ressoa. São
comentários sobre a política nacional ou internacional, sobre os
negócios ou a vida alheia. Ao final dos ofícios, quando nós monges
nos reunimos, infelizmente devo admitir que aos mesmos assuntos que
conversavam os leigos nos dedicamos. Pelo menos lá no nosso Templo
eu não receberia uma visita de Rennyo Shonin sem temer o que ele
concluiria de suas observações.
Outra vez tremo ao ler o trecho da carta IV-12 quando ele diz: “Qual a razão de se realizarem
reuniões duas vezes por mês? Estas reuniões visam a realização
da Mente Confiante que conduz ao nascimento na terra da suprema
Bem-aventurança e nada mais. Apesar de serem realizadas
“reuniões” em toda parte a cada mês, desde o passado até agora,
não tem havido nada que possa ser chamado de uma discussão sobre
a Mente Confiante. Nos últimos anos especialmente, quando
ocorrem reuniões (onde quer que se realizem) todos ao final vão
embora sem levar nada mais que o que beberam ou comeram _ saquê,
arroz e chá.”
Talvez a principal diferença hoje é que o cardápio é bem mais
diversificado. Estes problemas ocorrem de maneira idêntica na
atualidade tal como no passado porque a nossa ignorância espiritual
persiste. Continuamos sujeitos aos mesmos egoísmos, atraídos pelas
mesmas fantasias ilusórias e paixões cegas que ao longo da história
mantiveram-nos prisioneiros de erros e sofrimento. Mas nossas
atitudes comprometem não apenas nosso destino individual como também
o futuro da instituição da qual somos membros. Um velho provérbio
Hindu afirma que “Para que a floresta seja verde, basta que as
árvores sejam verdes.” Na época de Rennyo, o futuro do Honganji
estava em risco tanto pela ameaça de seus inimigos e detratores como
de seus próprios adeptos. Livramo-nos dos primeiros, continuamos
conosco mesmos.
Ouçamos o trecho, na carta I-2, em que Rennyo fala sobre a decisão
de tornar-se monge: “O princípio fundamental do Mestre
Shinran em nossa tradição não é que nos tornemos monges
aspirando nos tornar Budas, nem que renunciemos a família e nos
separemos dos vínculos mundanos. É que, quando ocorre o
despertar do momento-percepção do refúgio em Amida, a Mente
Confiante do Outro Poder se estabelece decisivamente, sem
distinção alguma entre homem e mulher, idoso ou jovem. O Sutra
Maior descreve o estado do atingir desta Mente Confiante como
“imediatamente alcançando o nascimento na Terra Pura e habitando
o estado do não-retrogredir. Num comentário, T’an-luan diz: “Com
o despertar do pensamento único do confiar, entramos na
companhia daqueles cujo nascimento está verdadeiramente
estabelecido.” Isto então é o que se quer dizer quando se fala
em “sem esperar que Amida venha ao nosso encontro no momento da
morte” e “completando a causa do nascimento na vida comum.”
Este trecho demonstra que para Rennyo, a ordenação e a entrega à
Mente Confiante são inseparáveis. Em outras palavras, alguém se
ordena porque o chamado do Buda é percebido como o centro de sua
existência. O processo espiritual do despertar para o Outro-Poder e
a formalização do rito de ingresso na comunidade de religiosos são
para ele como as duas faces de uma só e mesma moeda. Por isso ao
falar de porque nos ordenamos, o Oitavo Patriarca discute apenas o
despertar para a Mente Confiante. O que pensaria Rennyo de um fato
muito freqüente no Japão, quando alguns de nós monges, nos
ordenarmos porque somos o filho mais velho de um proprietário de
Templo, sendo hábito e expectativa, tanto da família como da
sociedade, que sejamos o sucessor e não ousamos contrariá-los? Ou,
em algum outro caso, quando herdeiros de um Templo, nos ordenamos
não porque tenhamos receio de contrariar família e sociedade, e sim
porque sendo o dito Templo pródigo em adeptos, a renda do
monge-responsável é atraente? Precisamos admitir que, dado o sistema
de propriedade particular da maioria dos Templos no Japão, com a
tradição do filho mais velho homem ser
o herdeiro e sucessor na sua direção, estas duas hipóteses não podem
ser descartadas como absurdas. Aliás, dificilmente algum membro do
Honganji com alguma familiaridade com a nossa comunidade no Japão
poderia dizer que isto nunca acontece ou mesmo que desconhecemos um
caso semelhante. Além disso, a precedência do filho, em detrimento
da filha, é já um absurdo e uma contradição doutrinária,
considerando o que nos disse acima Rennyo “sem distinção entre homem
e mulher”. Todos igualmente sabemos que, no caso em que a filha
tenha de herdar o Templo, (seja porque não exista um filho ou porque
exista um inusitada e improvavelmente rebelde a ponto de renunciar
ao suposto “dever”) a solução freqüentemente preferida é que ela se
case com um monge, para que ele, agora marido, assuma a direção do
Templo. Ou que o marido se ordene para assumir o Templo. Tudo isto,
como podemos ver nas afirmações de Rennyo sobre a mulher, nada tem a
ver com o Budismo da Terra Pura. Reflete isto sim, o machismo que
ainda domina a sociedade nipônica (que aliás nisto está acompanhada
pela esmagadora maioria das sociedades contemporâneas, seja no
Oriente, seja no Ocidente) e que foi absorvido pela nossa
comunidade. Especificamente no Honganji não seria necessário ir
muito longe para se concluir que lamentavelmente o preconceito, além
de ter sido absorvido, subsiste intocado. Basta nos perguntarmos por
que não há nem houve ainda u’a mulher ocupando o cargo de Sotyo, em
nenhum dos países onde o Honganji possui Missão com esta função,
como é o caso do próprio Japão, dos Estados Unidos, do Canadá, do
Havaí ou do Brasil? Por que, entre os Ministros que dirigem o
Honganji (e que são eleitos por um mandato) não há nem houve ainda
uma única presença feminina?
Precisaríamos ler e reler Rennyo, inspirando-nos nas suas palavras,
não só na passagem acima citada, mas também quando ele diz, na
carta V-3: “As mulheres que renunciaram ao
mundo enquanto permanecem na vida leiga, bem como todas as
demais mulheres que seguem a vida comum, deveriam realizar, sem
acalentar qualquer dúvida possível, que a libertação é para
todas as pessoas que simplesmente confiarem em profundidade (de
todo coração e com firmeza) no Buda Amida e entregarem-se ao
Buda para que as salve, conduzindo-as à condição de Buda na
outra vida.”
Ou ainda na carta seguinte V-4: “Aqueles que carregam um profundo
mau karma, sejam homens ou mulheres, precisam perceber que mesmo
confiando-se aos votos compassivos dos vários Budas, é
extremamente difícil serem salvos pelo poder destes Budas, pois
estamos no período do mundo maligno da última Era. Assim sendo,
aquele que reverenciamos como Amida Tathagata, sobrepassando
todos os outros Budas, fez o grande Voto de salvar mesmo os que
cometem o mal nas dez transgressões e nas cinco graves ofensas.
Realizando seu Voto, tornou-se o Buda Amida.”
Em todos estes trechos citados, Rennyo enfatiza a igualdade entre
homens e mulheres no mais crucial e supremo aspecto da realização
humana, o nascimento na Terra Pura. Se não há “distinção alguma
entre homem e mulher” no estabelecimento decisivo da Mente
Confiante, quanto mais absurda não há de ser a discriminação que
arroga ao homem privilégios e regalias em assuntos de menor monta,
como cargos na nossa hierarquia administrativa do Honganji.
Imagino que você, leitor lusófono, que talvez esteja travando um
primeiro contato com a tradição da Terra Pura através deste texto,
possa estar surpreso ou perplexo ante o que, nos parágrafos
precedentes, lhe pareçam críticas contundentes à instituição a que
pertenço, o Honganji, e à nossa comunidade, tanto de leigos como de
monges. Não se assuste. Nós, membros da Escola da Terra Pura, somos
assim, estamos sempre buscando nos conscientizar de nossas falhas e
desejosos de as discutirmos. Acreditamos que o ser humano erra muito
e quando esconde de si as suas faltas, erra ainda mais. Nem pense
que critico os meus amigos no Dharma por me imaginar mais correto
que eles. Lendo com atenção o trecho em que me refiro
especificamente à nós monges, no comentário à carta I-8 sobre o
Templo em Yoshizaki, você poderá perceber que me sei parte do
problema. Para a Escola da Terra Pura, somos todos muito errados,
maus, e inútil é tentarmos distinguir o melhor do pior. Quando
critico-nos, critico-me. E o faço na esperança de que,
conscientizando-nos destes nossos erros que creio perceber, possamos
superá-los. Isto nos libertará para podermos cuidar de outros erros
que então descobriremos. Não creio que possa existir uma comunidade
humana em que não se cometam falhas. Temo, isto sim, por aquelas que
se recusam a perceber e discutir abertamente as suas culpas. Por
fim, creio que nosso Oitavo Patriarca foi bem mais rigoroso nas
críticas que fez à comunidade do seu tempo do que eu soube ser em
meu texto.
Uma obra como a realizada por Rennyo Shonin só é possível através de
uma personalidade que reúna qualidades díspares, raramente
encontradas num só indivíduo. Rennyo manifestava a devoção profunda
e a compaixão que a Mente Confiante inspira na verdadeira realização
espiritual, como o demonstra a vida inteira dedicada ao chamado do
Buda por todos os seres, bem como sua atitude ímpar frente à morte.
Neste sentido, o Oitavo Patriarca se sobressai como líder espiritual
de rara grandeza.
Possuía o intelecto crítico e a cultura apurada de um “scholar” como
se evidencia de suas análises doutrinárias.
Reunia ainda a visão e habilidade política de um Estadista, como se
pode perceber na sua liderança de uma comunidade cada dia mais
numerosa, num ambiente politicamente adverso e violento.
Por fim, era sem dúvida dotado de um espírito empreendedor que hoje
reconheceríamos como “um executivo realizador”, como comprova o
crescimento vertiginoso que o Honganji teve sob sua direção,
considerando o aumento do número de adeptos e os inúmeros Templos
que foram construídos por sua iniciativa, bem como o desenvolvimento
organizacional através, entre outras coisas, dos rituais que criou,
das regras que estabeleceu, etc.
Ao fundar o Honganji que hoje conhecemos, ele se fez, de fato,
co-fundador de Jodo Shinshu. Não é sem razão que nos altares do
Honganji, à esquerda da imagem do Buda Amida há uma pintura com
Shinran e à direita uma pintura com Rennyo.
O jovem brasileiro que depois viria a se ordenar na Escola da Terra
Pura, só pode conhecer a mensagem de que o Buda Amida o libertara,
graças à Shinran Shonin. Ele só pode conhecer o que ensinou Shinran
Shonin, graças à obra de Rennyo Shonin. Foi através do Honganji, a
cujo fortalecimento o Oitavo Patriarca dedicou sua vida, que ele
pode um dia conhecer seus amigos Myokonin e com eles conviver apesar
da distância no espaço e no tempo; Saiichi, Genza e tantos outros
que trouxeram confiança, alegria e a gratidão à esta existência
confusa. Mais uma vez, foi através do Honganji que ele pode ter
acesso à doutrina que o ajudaria a entender quanto se lhe esclareceu
de um caminho extraordinário, no qual sua própria vida, assim como a
de todos os seres, vai sendo sábia e infalivelmente conduzida à
Plenitude, ao nascimento na Terra em que toda ignorância e
sofrimento são superados e onde enfim despertamos como Budas.
Em “O caminho do campo” Martin Heidegger diz que o carvalho ensina
que “crescer significa: abrir-se à amplidão dos céus, mas também
deitar raízes na obscuridade da terra.” (Heidegger, Martin, “O
caminho do campo” Ed. Duas Cidades, 1969, São Paulo) A obra de
Rennyo Shonin buscou deitar raízes na terra obscura e densa do
tempo, da história, criando condições concretas para a expansão e
continuidade da mensagem de Shinran Shonin. Sem estas raízes
profundas e firmes talvez já nem mais soubéssemos que o Buda da Luz
Infinita vem libertar-nos, tal como somos, através do Nembutsu do
Outro Poder. Este modo peculiar de perceber e compreender o caminho
para a libertação humana se origina em Shinran. Sem esta base
institucional firmada na terra, talvez nem mais soubéssemos que um
dia viveu e pregou alguém como Shinran Shonin, nem tivéssemos
notícias de que existiram “pessoas raras e maravilhosas” neste mesmo
mundo confuso em que nos encontramos.
Mas, na trajetória biográfica de Rennyo, assim como ao longo de todo
o Gobunsho, vemos que as raízes na terra visam acolher o chamado,
amplo como o céu, do Nembutsu do Outro Poder, para o qual sua vida
foi dedicada. A razão única e última de sua luta e esforço era que
todas as pessoas pudessem ouvir o Nome do Buda da Luz Infinita para
assim serem libertadas. Consolidar o Honganji, construir Templos,
organizar uma comunidade, elaborar seus ritos, só era importante
para que o Dharma encontrasse condições mais favoráveis para ser
ouvido e a libertação pelo Nembutsu pudesse ser conscientizada por
mais pessoas.
Quinhentos anos depois, vemos que a obra do Oitavo Patriarca
frutificou, num alcance maior do que se poderia imaginar em seu
tempo. Em cinco continentes o Nembutsu é entoado. Nestes distantes
rincões todos do planeta, pessoas das mais diversas raças expressam
sua gratidão nos ofícios em memória de Rennyo Shonin. Oxalá saibamos
cumprir a parte que nos toca, encaminhando rumo ao futuro o legado
que ele nos deixou. Que estes primeiros quinhentos anos sejam
relembrados daqui a quinhentos anos, no ofício comemorativo do
primeiro milênio de Rennyo Shonin. Namo Amida Butsu.
“Não sei porque, mas ultimamente (ao longo deste verão) tenho
sentido muita sonolência. Quando me pergunto por que estou tão
letárgico, sinto que, sem dúvida, o momento da morte que nos
conduz ao nascimento (na Terra Pura) pode estar próximo. Este
pensamento me entristece e sinto em especial a dor de partir. E
no entanto, até este dia de hoje tenho me preparado sem
descuido, pensando sempre que o momento da morte pode ser
iminente. Tudo o que mais desejo, dia e noite, em relação a
isto, é que após a minha morte não haja retrocesso naqueles
dentre os visitantes deste Templo cuja Mente Confiante esteja
decisivamente consolidada. Tal como as coisas estão agora, não
deveria haver dificuldades caso eu morresse. Mas cada um de
vocês tem se descuidado na reflexão sobre o nascimento. Enquanto
vocês viverem, devem procurar ser tal como lhes descrevi.
Sinto-me insatisfeito com o que cada um de vocês compreendeu.
Nesta vida, até o amanhã é incerto e, independente do que
dissermos, nada é de qualquer valia quando a vida finda. Caso
nossas dúvidas não forem com clareza dissipadas durante esta
vida, sem dúvida lamentaremos. Espero que vocês mantenham isto
em mente.
Respeitosamente,
Isto é confiado aos que se reúnem do outro lado das portas de
correr. Nos anos vindouros, por favor levem para fora e leiam.”
Minor e Ann Rogers, “Rennyo”, Asian Humanities Press, Berkeley,
1991, pag. 154
O grato coração da alegria…
O Namu Amida Butsu da tristeza e da alegria!”
“Os ensinamentos das várias Escolas diferem mas como foram todos
expostos durante o período de vida de Sakyamuni, eles são de
fato a Doutrina incomparável. Por essa razão não há dúvida
alguma de que as pessoas que praticam estes ensinamentos tal
como é prescrito, atingirão a Iluminação e se tornarão Budas.
(…)”
Minor e Ann Rogers, “Rennyo”, Asian Humanities Press, Berkeley,
1991, pag. 196
A minha fundamental razão para estar neste local então, nunca
foi para usufruir da minha vida em tranqüilidade, nem para
buscar riqueza ou fama ou regozijar-me com a beleza das flores e
dos pássaros, o vento e a lua. Meu único anseio é que os
praticantes em quem a Mente Confiante esteja decisivamente
consolidada floresçam e que os companheiros praticantes que
recitam o Nembutsu venham em busca da Suprema Iluminação. Além
disso, se existirem pessoas que tenham preconceito (para
conosco) ou se dificuldades surgirem, renunciarei a meu apego a
este lugar e de imediato me retirarei. Assim sendo, se (todos) _
independentemente de serem nobres ou de origem humilde, monges
ou leigos _ puderem ser encaminhados a um decisivo
estabelecimento da Mente Confiante que seja firme e adamantino,
isto estará em verdadeiro acordo com o Voto Original do
Tathagata Amida e em particular, em conformidade com a
fundamental intenção do Mestre Shinran.
É extraordinário que, com o presente ano, este velho homem tolo
tenha já alcançado a idade de oitenta e quatro anos. E como esta
vida talvez tenha de fato estado em acordo com o significado do
Dharma em nossa tradição, eu não poderia ter maior satisfação.
Mas tenho permanecido doente desde o verão deste ano e no
momento não há sinais de recuperação. Sinto, enfim com certeza,
que não falharei em alcançar meu tão longamente acalentado
desejo de nascer na Terra Pura durante o próximo inverno. Tudo
que eu anseio, seja dia ou noite, é que a Mente Confiante se
estabeleça decisivamente em todos ainda enquanto estou vivo.
Ainda que isto dependa de boas (condições) do passado, não há um
só momento em que (esta preocupação) não esteja em minha mente.
Além do mais, isto talvez se deva ao fato de eu ter vivido aqui
durante três anos. De todo modo então, deixem que a Mente
Confiante se estabeleça decisivamente neste período de sete dias
durante os ofícios de agradecimento, para que todos possam
realizar o sentido fundamental (do Dharma), o nascimento na
terra da suprema alegria.
Respeitosamente,
Esta carta deve ser lida, inicialmente no vigésimo primeiro dia
do décimo primeiro mês de Meio 7 (1498) para que todos alcancem
a Mente Confiante.
Minor e Ann Rogers, “Rennyo”, Asian Humanities Press, Berkeley,
1991, pag. 239
Nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
Ainda que para isso tenha de ser
O meu corpo e a minha alma
a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade
Ainda que para isso tenha de a perder como minha.”
Pessoa, Fernando, “Obra Poética”, Ed. Aguilar, Rio de Janeiro
1972, pag. 15
(Ob. cit., pag. 157)
(Ob. cit. pag. 236)
(Ob. cit. pag. 145)
(Ob. cit. pag. 244)
(Ob. cit. pag. 244)